segunda-feira, 12 de maio de 2014

Opus Latericium - Termos técnicos de construção civil romana no Algarve (2)


No anterior spot sobre o "Diamicton" referi-me, de passagem e sem grandes pormenores, ao "Later". Pois bem, agora vou acrescentar mais alguma coisa, não muito para não maçar os meus leitores.
Tijolo com marca de oleiro, das ruínas de Milreu
O "later" é, em suma, um vulgar tijolo de barro, que, quando menos espesso e grosseiro, pode também chamar-se ladrilho. Neste caso servia para cobrir o chão das casas, as paredes exteriores e até os arcos das abóbadas de berço, de canudo ou de meio canhão, tão características da arquitectura romana. Os tijolos romanos diferenciam-se dos de hoje pela sua forma densa, compacta e alongada.
Existem várias denominações para o tijolo romano (later), conforme a sua cozedura e tipo de fabrico. Assim, classifica-se como "later crudus" o tijolo rudimentar, feito à mão em barro cru, que é cozido ao sol. Era algo semelhante ao tijolo adubino, que remonta ao Antigo Egipto, e que ainda hoje se usa nas construções em taipa e adobe, muito comum na zona do Magreb. Mais perfeito e exigente, na sua composição e moldagem, por ser cozido em forno, é o "later coctus", por vezes nomeado somente por "coctilis".
Logicamente obedeciam a vários formatos e feitios, e por isso eram autenticados pelo próprio fabricante, que neles gravava o seu nome ou o da olaria. Aliás isso é perfeitamente visível nos vários e diferenciados "lateres" que foram encontrados no Milreu, e se encontram actualmente depositados no Museu Arqueológico e Lapidar Infante D. Henrique, em Faro.
A oficina ou olaria onde eram fabricados os tijolos de barro chamavam-se "lateraria", e em Ossónoba, actual Faro, existiram várias.
"Laterculus" era a designação que se dava aos tijolos e ladrilhos de pequenas dimensões, o que, por extensão, passou a chamar-se também a qualquer objecto de barro que tivesse o mesmo feitio. Por isso, há que ter cuidado e muita atenção, porque os arqueólogos, nomeadamente os italianos, usam a classificação "laterculus" para todos os pedacinhos de barro que, sem saberem do que se trata, registam nos seus espólios e até nos inventários dos museus.
trecho de parede construída em "opus latericium",
Por "Latericius" designava-se tudo aquilo que fosse construído com tijolos de barro grosseiro ou com ladrilhos de fraca qualidade. O chamado "opus latericium" é o aparelho de construção usado pelos romanos para encher as cofragens das paredes dos edifícios. Não esqueçamos que alguns dos edifícios e monumentos da Roma antiga tinham vários andares, e até as populares "insulae", onde residia o povo miúdo da cidade, eram erigidas em tijolo e madeira de fraca qualidade, mas não ruíram senão às mãos dos bárbaros. As técnicas de construção dos romanos eram fiáveis e muito avançadas para o seu tempo, recorrendo muitas vezes à cal hidráulica, uma técnica que levamos quase mil anos para descobrir como se fazia.

Em "opus latericium" é construída uma parte do edifício designado por templum que se encontra nas ruínas do Milreu.

domingo, 11 de maio de 2014

LÁBDANO, a resina da esteva


A flor da Esteva
   Designa-se por Lábdano ou Ládano a planta silvestre, muito vulgar por entre os matos do sul peninsular, conhecida por Esteva. A sua designação científica, cistus ladanifer, deriva precisamente do lábdano, que é o óleo resinoso que cobre as folhas verde escuras da planta. Quem já andou pelas matas algarvias por certo já colheu a flor da esteva, seduzido pelo aroma da sua resina, que supunha ser o perfume da flor. Embora seja uma planta silvestre, a esteva é de uma beleza ímpar e sedutora. Apresenta-se em forma de arbusto, com mais de um metro de altura, e tem uma flor grande de uma brancura imaculada. Possui cinco pétalas muito finas, com uma pinta bordeaux em forma de ponta de lança. Ao centro os estames amarelos cintilantes parecem uma coroa de fios de de ovos. Há quem lhe atribua propriedade medicinais únicas. Em chã é muito recomendado o chã das flores para o colesterol e a rama para o combate ao ácido úrico. Muitas outras propriedades lhe são atribuídas, que não vem agora e aqui ao assunto.
   Uma das suas utilidades, depois de seco o arbusto, é como combustível natural. Antigamente, nos campos algarvios, cozinhava-se com o fogo da esteva, pois que sendo uma planta lenhosa e resinosa transforma-se facilmente num combustível de fácil incineração. A chama do fogo da esteva é muito luminosa e incandescente, mas dura pouco, porque a planta-se consome-se rapidamente. Por isso é muito boa para acender o fogo das actuais lareiras, funcionando como uma espécie de acendalha natural. Quando no verão as florestas ardem por esse país fora, a esteva é o maior inimigo dos bombeiros.
   Mas o mais importante da esteva é o Lábdano, essa natural exsudação resinosa e aromática que ressuma das suas folhas, muito empregue na indústria da perfumaria, e actualmente também na farmacologia. A forma como era capturada antigamente constitui o cerne deste apontamento. O método era rudimentar, mas creio que ainda hoje não se conhece outro. Fazia-se do seguinte modo: dois homens seguravam nas pontas de uma corda de crina (feita geralmente com a lã da ovelha) e passavam-na meticulosamente por cima das estevas para capturar a resina. Havia também quem improvisasse atando cordéis a um pau curto e com ele se sacode todas as manhãs as plantas, enquanto estão cheias de orvalho. O método mais rudimentar era o dos pastores, que levando os seus rebanhos para os matos das estevas, costumavam ao fim do dia pentear pacientemente a lã do pescoço e do dorso dos animais, para dela extrair a resina. Apanhada a resina tratava-se depois de a derreter em lume brando até que por fim se deixava coalhar.
   A principal utilização industrial da resina da esteva é na preparação da perfumaria, onde é empregue como fixador. Por isso, no século passado houve um indivíduo francês que passando pelo Algarve verificou que a esteva era uma espécie de praga natural que se desenvolvia sem custos nem trabalhos. Logo fez divulgar pela imprensa regional que iria aqui fundar uma fábrica de perfumes. O caso subiu às instâncias superiores que acolheram a ideia com júbilo. Só havia um pequeno pormenor: o indivíduo não tinha capital para fundar a indústria, mas tinha o saber especializado para extrair a resina e começar a produzir perfumes no Algarve. É claro que se fosse hoje o homem estava garantido. Mas, naquela altura, o governo mandou-o primeiro arranjar o capital junto dos investidores do país dele, e só depois é que estaria disposto a recebê-lo para se pensar nessa tal indústria dos perfumes do Algarve.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

DIAMICTON - Termos técnicos de construção civil romana no Algarve


Edifício do Templum de Milreu
O diamicton consiste na forma de aparelho usada pelos construtores romanos nas paredes e muros dos edifícios que encontramos em diversas estações arqueológicas no Algarve, como por exemplo em Milreu.
As superfícies exteriores dos edifícios romanos eram feitas em pedra ou cobertas de ladrilho, mas o centro, isto é o grosso da parede, era preenchido com pequenas pedras e argamassa. É esta a forma de construção que se encontra nas ruínas do Milreu. Aí o revestimento exterior é em "later", ou seja o conhecido "opus latericium" muito comum no sul peninsular, enquanto o revestimento interior é uma espécie de alvenaria grosseira.
O "diamicton" diferencia-se do "emplecton" porque este tinha a mais o chamado "diactoni", isto é, uma espécie de pedra talhada que de espaço a espaço atravessava toda a espessura da parede, contribuindo para a sua solidez.
Panorâmica da estação arqueológica da Villa do Milreu
Ver outras formas de construção de paredes romanas nas minhas fichas sobre "Caementicia" e "Isodonum".
Como nota curiosa acrescentarei que era também o "diamicton" o sistema de construção empregado no "balineum" luso-romano descoberto em S. Vicente do Pinheiro (ver crítica a um trabalho sobre o assunto publicado no «Arqueólogo Português», vol. VIII, p. 167)
Ao "diatoni", atrás referido, e característico do "emplecton" chama-se na crítica "junteiros".