sábado, 20 de fevereiro de 2016

Morreu o último sábio do nosso tempo, UMBERTO ECO


Vítima de cancro, de que padecia há vários anos, faleceu na noite de sexta-feira, dia 19-02-2016, no conforto da sua casa de Milão e junto da família, aquele que sempre considerei como o último sábio da humanidade. A imprensa vai certamente referir-se a ele como o escritor italiano, autor do best-seller «O Nome da Rosa», adaptado ao cinema pelo realizador Jean-Jacques Annaud, com Sean Connery com protagonista. Nada mais redutor. Umberto Eco foi escritor apenas por diversão e desafio, porque na essência da sua alma estava a insatisfação e a necessidade de criar novos caminhos nunca antes percorridos. Acima de tudo foi um filósofo que percorreu um longo trajecto intelectual, abarcando todos os conhecimentos primordiais do humanismo, desde a matemática e a geometria até à astronomia, passando pela arte e a linguística, até culminanar na semiótica. De tudo procurava saber este insaciável cidadão do mundo culto, figura cimeira da humanidade ilustrada.
Foi através da publicação, em 1980, do seu primeiro romance, «O Nome da Rosa», que o seu nome extravasou as fronteiras naturais da Europa. Rapidamente a obra alcançou um enorme sucesso internacional, traduzido nas principais línguas mundiais, vendendo milhões de exemplares. 
Embora a sua lista de obras seja vastíssima, principalmente no ensaísmo de foro académico, sobre semiótica, linguística, estética e filosofia, foi sobretudo na literatura e no género do romance que alcançou prestígio e sucesso. Destaco aqui O Pêndulo de Foucault editado em 1988, A Ilha do Dia Anterior (1994), Baudolino (2000), A Misteriosa Chama da Rainha Loana (2004) e O Cemitério de Praga (2011), este último considero primoroso pela ousadia como classifica tão despudoramente os alemães e os judeus, não os poupando aos mais insultuoso adjectivos.
No ano passado saiu na Gradiva o seu último romance, «Número Zero», que é uma severa crítica ao mundo do jornalismo. Eco não poupa o mundo da imprensa, a submissão do jornalista ao índice de vendas, a especulação e a mentira, a implacável destruição do bom nome dos cidadãos, a corrosão da moral e da honra, em suma a perversão da ética e da integralidade profissional para satisfação de velados interesses, quer da política quer da finança. 
Presentemente, e apesar de aposentado do mundo académico, Umberto Eco desempenhava as honrosas funções de presidente da Escola Superior de Estudos Humanísticos, na Universidade de Bolonha.
Morreu hoje o último sábio do nosso tempo. O dia começou triste e deprimente. Vou recomeçar a ler «O Cemitério de Praga», e rezar uma oração pela alma de um dos principais mentores da minha vida académica e intelectual.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Movimento demográfico do distrito de Faro em 1906


Os historiadores que gostam de trabalhar as fontes demográficas sabem que os registos paroquiais existentes nas igrejas (os mais antigos depositados nos arquivos históricos do município, do distrito ou da Torre do Tombo), são um incontornável manancial de informação. Não querendo saturar a paciência dos meus leitores, vou deixar aqui um breve apontamento sobre os casamentos, batizados (nascimentos) e óbitos, registados no distrito de Faro desde 1 de janeiro até 30 de junho de 1906.
Casamentos foram no total 860, com a curiosidade dos homens serem 782 solteiros e 78 viúvos, e das mulheres serem 824 solteiras e 36 viúvas. O número de homens que fazem segundas núpcias é o dobro das mulheres. Não há nenhum caso de nubentes em terceiras núpcias. É curioso que 68 dos casamentos foram celebrados entre parentes do 1º e 2º grau, ou seja, 4 foram de tios com sobrinhas e 64 foram de primos com primas, a maioria dos quais oriundos da classe alta ou média alta. Entre os 860 esposos constata-se que só 212 assinaram os termos dos casamentos, e entre as esposas só assinaram 221. Os casamentos revelam que o índice de alfabetização social era muito baixo, sobretudo entre os homens, e nas classes laboriosas. No total percebe-se que 1287 são analfabetos (648 homens e 639 mulheres) sendo que só 433 dos nubentes sabem ler e escrever. Outra curiosidade é que 855 dos esposos são portugueses (a maioria oriundos do Algarve) e 5 são espanhóis, do distrito de Huelva; entre as 860 esposas só uma era espanhola.
Nascimentos foram no total 4209, dos quais 2133 eram masculinos e 2076 femininos. Portanto nasciam mais homens do que mulheres, uma tendência que se mantinha de anos anteriores, e que parecia querer equilibrar o índice demográfico dos géneros, que era largamente favorável às mulheres.
Óbitos foram no total 2298, dos quais 1246 eram homens e 1052 eram mulheres. Por conseguinte, registou-se um crescimento demográfico positivo, pois a diferença entre os nascimentos e os óbitos foi favorável em 1911 indivíduos, dos quais 887 eram meninos e 1024 eram meninas.

Só por curiosidade se acrescenta que o índice da mortalidade infantil era já muito baixo, com uma taxa de sobrevivência acima dos 80% após o primeiro ano de vida. Entre a classe alta e média alta não constam nados-mortos nem falecimentos em trabalho de parto.