A última entrevista que
o escritor Manuel da Fonseca deu à imprensa - por acaso um órgão de referência,
«O Expresso» -, publicou-se a 20-03-1993, como derradeira homenagem á sua obra
literária, visto que falecera nove dias antes da mesma sair a público.
Considero essa informal
conversa, ao semanário Expresso, como um documento autobiográfico, muito útil
para a compreensão da sua vida e obra. O escritor Manuel da Fonseca sempre foi
um homem sem medo, que por isso sempre se colocou na margem esquerda da vida. E
como à data da entrevista já tinha 81 anos de idade, sentia que o fim estava
para breve. Daí que não cuidasse das palavras, a ponto de esconder a verdade,
nua e crua, como sempre acontece com os nossos escritores, à excepção do Lobo
Antunes, que esse nunca as poupou a ninguém.
Manuel da Fonseca, anos setenta, no Algarve |
Manuel da Fonseca, anos
setenta, no Algarve
Só para dar um exemplo
do teor da entrevista, aqui vos deixo um breve trecho, que constitui a sua
resposta à pergunta: «E como se movimenta nos meios literários?»
A resposta é lapidar.
Disse o que pensava, e com absoluta sinceridade, sem medo da máfia de
escritores desprovida de talento e génio, que de braço dado com a crítica
acéfala, domina as editoras, os média e até o próprio ministério da Educação.
Ouçam bem as palavras
de Manuel da Fonseca, e vejam lá se, nestes 27 anos que se seguiram, alguma
coisa mudou:
Festa da Amizade, Santiago do Cacem, em 1981 |
«Muito mal. É uma jogada fina. Dizes bem de mim que eu digo bem de ti,
nós é que somos bons. É um mundo com muita hipocrisia. Eu não frequento os
meios literários, sou muito malcriado, porque digo logo o que sinto. Aliás
nisso sou como o Lobo Antunes. Hoje há uma intelectualidade balofa, uma vaidade
de calça de ganga: grandes parangonas nos jornais, deste e daquele escritor,
mas tudo é efémero, nada vai ficar - como a rosa daquele poeta francês.»
É por causa disso que
vemos para aí uns tordos armados em escritores, cujo sucesso literário não se
justifica no talento das suas obras, mas antes nos aventais que vestem em
segredo, uns atrás dos outros, nos templos das colunas murchas.
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