sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Valha-nos Santa Rita, a justiceira do povo


José Carlos Vilhena Mesquita

Após dois anos de governação (infra)socrática, qualquer cidadão tem hoje plena consciência que vivemos tempos de perturbante intranquilidade social, provocada por uma política de cariz absolutamente invertida, que contraria os mais elementares ideais socialistas em que supostamente se deveria inspirar o colégio governativo. Por razões que se prendem ao foro da psicanálise-política, quando o PS assume o governo adopta uma política de direita, hostilizando o operariado industrial e os trabalhadores não-especializados, nivelando-os numa massa informe de proletarizados, de forma a esbater o seu poder de luta e a sua capacidade reivindicativa.
Apoderou-se do país e, sobretudo de quem trabalha, uma angustiante sensação de insegurança e de medo, um lancinante silêncio, um abominável terror branco, que a todos deprime, atormenta e humilha. Vivemos hoje sob o espectro da delação (tal como no tempo da PIDE), aterrorizados com a vil possibilidade de um colega de trabalho nos denunciar ao nosso superior hierárquico só para agradar às chefias, para lhes conquistar a confiança de um cão de fila, e com isso abichar sinecuras e favorecimentos. Vimos disso exemplo no episódico saneamento do Dr. Charrua, em que igualmente se vislumbram os reacendimentos de antagonismos partidários, supostamente apaziguados desde o consulado cavaquista.
A chibata do governo surgiu de forma alarmista, sob a invocação da crise económica. Mas, na verdade, o chicote do poder estrondeou sobre os débeis costados do povo de uma forma indirecta e induzida, mercê do velado apoio que o governo tem prestado aos grandes empresários oriundos dos sectores industrial, imobiliário e bancário, os quais ameaçam impunemente os trabalhadores com o desumano espectro do desemprego. É o terrorismo empresarial com que o governo parece mostrar-se complacente.
Toda esta política tem desembocado numa crescente proletarização dos sectores económicos. Deste modo, o governo vai conseguindo reduzir os serviços terciários, desvalorizando a qualificação, o prestígio e a influência socioeconómica da classe média, sociologicamente considerada como a pedra angular das democracias modernas e saudáveis.
Está claramente visto que a política deste governo se traduz numa absoluta rasoira social. Do seu nominal socialismo, só talvez ainda subsista o cheiro do fumo em que se vem esturricando a dignidade daqueles que, ao cabo de uma vida de trabalho, vêem agora cada vez mais longe a sua reforma, e pior do que isso, vêem cada vez mais perto a ameaça de um despedimento precoce. O que se passou com os professores, com os funcionários públicos ou o que se está a passar com os trabalhadores dos departamentos regionais do Ministério da Agricultura, é simplesmente abominável. A angústia e o terror paira agora sobre a cabeça de todos aqueles que trabalham, e muito particularmente sobre aquela geração que ajudou a levantar o país há trinta anos atrás, sustentando a esperança de ver um futuro mais próspero e mais justo para os seus filhos.
A mais recente bandeira do governo é o flexi-emprego, o flexi-trabalho, e outras flexibilizações que significam a genuflexão dos trabalhadores face aos poderes instalados. Essa flexi-política, imitada dos países nórdicos, não passa de uma contrafacção ciganóide, a exigir rápida intervenção da ASAE. Aliás a flexibilização do emprego e do trabalho, não passa duma política anti-social, de favorecimento e de indulgência dos poderes discricionários, não só do patronato como também do governo. E o que mais me assusta é precisamente a possibilidade do governo poder despedir os funcionários por razões de “flexibilização” dos serviços públicos, o que se traduzirá, a curto prazo, numa onda de saneamento partidário, que poderá mergulhar o país numa sanha de racismo político.
Quem votou no Socialismo Democrático, perfilha logicamente ideais induzidos e conquistados pela Revolução Francesa, cujos valores ético-sociais têm sido estranhamente vilipendiados, abjurados e até postergados por aqueles que precisamente dizem ser socialistas. É nesse aspecto que não se admite nem se justifica a actual política governativa.
Assistimos hoje, placidamente, à inversão total dos ideais socialistas que inspiraram a Revolução de Abril. Nunca, como agora, se viram índices tão elevados de prescrição médica de ansiolíticos, de anti-depressivos e de outros medicamentos estabilizadores do humor, para atenuarem a plangente situação em que se encontram milhares de famílias.
A justificação do falhanço geral deste país reside nos políticos e nesta despudorada partidocracia, que subalterniza os interesses do país, aos seus interesses de grupo e à ânsia de conquista do poder. A incompetência e a desfaçatez tomou conta do país – e tanto valem os do PS como os do PSD. Os homens íntegros, escrupulosos, competentes e honrados, fugiram, ou foram afastados, das fileiras partidárias. Em seu lugar instalaram-se os oportunistas e aventureiros, que os partidos aceitaram sem o mais ligeiro critério de selecção.
Com pungente ironia costumo dizer que em Portugal mal se sabe ler e quase nunca se sabe pensar. O governo, na senda dos seus predecessores, tem-se dedicado à destruição do antigo e exigente aparelho educativo, caricaturando grotescamente o nosso povo no seio da Europa, como sendo inferior e iletrado, quando na verdade têm sido os políticos portugueses a jungir-nos a canga da ignorância com reformas educativas inconsequentes, precárias ineficazes.
Resta-nos a esperança de ver assomar-se no horizonte a mítica sombra do redentor, fruto do proverbial sebastianismo, salvífico e regenerador da alma lusitana. Eis agora, erguida do húmus nacional, a esfíngica figura da justiceira do povo, a nossa Maria José Salgado, miscigenação populista da Padeira de Aljubarrota e do espírito de alterne em que revemos o nosso glorioso passado. Somos um povo encarnado na inveja, uma raça de águias que correram o mundo conquistando glórias, mas que perderam as asas em flamejantes pelejas, contra míticos e poderosos adversários, plasmados na invicta força da sua suprema coragem.
Mas temos agora, a nossa Maria José, qual St.ª Rita de Cássia, padroeira dos impossíveis, cuja força justiceira nos devolverá o orgulho nas glórias do passado, condenando ao degredo os nossos cerúleos adversários.
Abaixo o filosofismo socrático e o verde loureiro da esperança política...
Viva a Santa Ritinha de Cássia, que os nossos seis milhões de votos ainda farão erguer-se à Presidência da República... sem precisar de dar cavaco a ninguém.

P.S. – este texto foi publicado em 2007, e refere-se a duas figuras, que se tornaram excessivamente mediáticas, deixando ao leitor o cuidado de as interpretar. Em todo o caso este texto serve também para identificar o país que temos o e o povo que somos.

6 comentários:

  1. Olá, bom dia, meu caro!
    Acabo de postar o endereço do seu blog,
    numa lista de amigos que recentemente publicaram poemas meus,
    ou à minha poesia se referiram.

    Um abraço.

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  2. Olá Vieira Calado
    Obrigado pela divulgação do meu blog.
    Infelizmente são poucos os visitantes que comentam os spots. É pena porque nunca fico a saber se o blog tem ou não interesse.
    Um abraço do amigo
    Vilhena Mesquita

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  3. VEjo que o Profº também culpa os politicos do falhanço da Nação !

    Mas nós vivemos numa democracia e ai é o povo quem mais ordena ! O Povo escolhe.


    Vitor Xelim

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  4. Obrigado Vitor pela sua colaboração neste Blog.
    De facto eu culpo os políticos porque não há outros culpados. Afinal de conta são eles que gerem os negócios internacionais e a administração interna. Se o país se atrasa cada vez mais em relação ao resto da Europa, só nos podemos queixar dos que nos governam.
    De facto vivemos em democracia, e ainda bem que é assim. O povo é quem mais ordena e expressa a sua soberanis através do voto. Mas os partidos é que deveriam escolher melhor os seus políticos, e para isso têm de fazer um recrutamento de quadros de forma mais conscienciosa, isto é, não escolhendo os menos preparados nem os mais "dóceis", mas antes os mais ilustrados e impolutos. Infelizmente acontece o contrário. Os partidos escolhem para o exercício dos cargos administrativos os mais "amistosos", daí a onda de corrupção em que vivemos hoje.
    Obrigado pela sua opinião. Volte sempre.
    Um abraço do Vilhena Mesquita.

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  5. Caro Profº , desculpe concordar consigo na forma como analisa mas não na genesis do problema!!!

    Como o profº sabe a coisa mais dificil de analisar são as causas e os porquês das coisas. Mesmo nós em relação a nós próprios não sabemos como fomos criados: Existe a teoria do macaco ( evolucionista) mas também existe a teoria de que fomos criados ( determinista).

    E isto aplica-se aos partidos também. Há quem ache que os partidos vão evoluindo e consuante as pessoas que vão aparecendo assim se vão orientando ( Esta é a sua teoria, equivalente à teoria evolucionista). E há a outra, de que os partidos foram criados com um determinado fim e que escolhem as pessoas para liderá-los em função dos interesses dos seus criadores ( Esta é a minha teoria a determinista). À luz da segunda teoria pensar-se que os partidos não escolhem " ilustrados e impolutos " por uma questão de infelicidade é uma utopia mas à luz da primeira teoria faz sentido!

    Depois ainda temos a comparação com os outros partidos Europeus e outras nações e a situação é exactamente igual à nossa e para mim existe uma causa determinista nesta realidade, ou seja, existem organizações transnacionais ( Globais) que estão-se borrifando para os paises e o que querem é o control dos vários paises e dos seus povos , mas já não usam balas verdadeiras que fazem sangue,copmo outrora , mas usam a lei civil que controla os vários povos sem fazer uma gota de sangue no chão, mas causam o caos, a desordem na sociedade e conspiram e corrompem tudo e todos !

    Para essa missão, obviamente, escolhem os melhores elementos e que estão preparados até para vender a mãe !
    A Politica faz-se disto !

    vitor xelim

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  6. Caro amigo Vitor
    Na minha utópica maneira de ver, a vida e as coisas políticas, sempre entendi que os partidos deveriam recrutar os seus quadros entre os cidadãos mais capacitados para o exercício da respública. Com o decorrer do tempo tive a triste constatação que as coisas não funcionam assim. De qualquer modo vou permanecer na minha ilusão, com a esperança que talvez surja um homem que faça da verdade a sua bandeira e que não compactue com o espírito de partido, pois que tem sido esse o cancro da nossa democracia.
    Volte sempre.
    Um abraço do Vilhena Mesquita

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