João Peres |
Manda a justiça realçar que, em todos
os actos cívicos promovidos por aquela Junta, apercebi-me sempre da sua competência
e do elevado zelo com que cuidada do mais ínfimo pormenor, para que tudo, no fim,
corresse bem e fosse um sucesso. Pessoas com o sentido de responsabilidade do João
Peres eram, nessa altura como ainda hoje, muito raras, porque em geral quem realiza
e produz deixa-se seduzir pela ambição, que suscita a luz da vaidade. Nunca o João
Peres se aproximava dos lustres da ribalta, para chamar a si a vã glória do sucesso
ou do poder. A sua principal característica era a forma humilde, tímida até, como
declinava os elogios que lhe eram devidos, endossando-os sempre para a sua Gracinda,
que então presidia com enorme simpatia à Junta de freguesia de Olhão.
As circunstâncias do tempo e da política,
acabariam por levá-lo depois a assumir a presidência do executivo da Junta, creio
que por dois mandatos, e recentemente a presidir à assembleia da freguesia de Quelfes.
Mas de todas as conversas que com
ele mantive, as que mais me emocionavam eram as suas recordações de África e da
fatídica guerra colonial, da qual também eu guardava nefastas lembranças, quando
no Natal de 1964 recebi a notícia da morte do meu irmão Álvaro Manuel Vilhena Mesquita,
caído em combate na Guiné.
O João Peres é o exemplo do bom e
modesto português, que apesar de todas as circunstâncias, nunca se arrependeu nem
algum dia deixou de se orgulhar de ter defendido a Pátria na guerra colonial. Para
defesa da honra e dignidade de todos os que a seu lado defenderam a nação lusíada,
escreveu vários artigos na imprensa regional, nomeadamente no jornal «O Olhanense»,
elogiando aqueles que preservaram o nome e a glória de Portugal em África. E quando
já quase nos íamos esquecendo dos que nas antigas colónias zelaram pela soberania
nacional, o amigo João Peres bradava alto e com orgulho, que muitos dos seus camaradas
haviam regressado à pátria diminuídos na sua integridade física, moral e psíquica.
E foi com lucidez e coragem, que reivindicou o título de heróis nacionais para todos
os soldados portugueses (brancos, negros e mestiços), que no capim da savana derramaram
o próprio sangue, quando não perderam, na flor da idade, a sua própria vida.
Por causa dessa intransigente defesa
dos valores, que enformam a pátria portuguesa, é que o João Peres foi eleito presidente
do núcleo de Olhão da Liga dos Combatentes. Actualmente preside à Mesa da Assembleia-Geral,
continuando a desenvolver acções de grande merecimento público, nos domínios da
cultura e da acção social.
Para todos os que se interessam pela
história da guerra colonial, lembro que o meu amigo João Peres já publicou outros
trabalhos de grande interesse, nomeadamente «Retratos» em 2012, e «Memórias – Olhanenses
na guerra do Ultramar», em 2013. Em 2016, complementou os trabalhos anteriores num
livro de maior fôlego e abrangência intitulado «Memórias – combatentes na guerra
do Ultramar», no qual analisa e descreve a vida, o sofrimento e sacrifício de alguns
heróis que a seu lado combateram em África.
Este livro, que por amável deferência
me ofereceu, narra com grande realismo as circunstâncias em que sobreviviam, com
indizíveis dificuldades, as nossas forças militares nos antigos estados da Índia
Portuguesa. A sua leitura é de um interesse fundamental, sobretudo para quem pretenda
conhecer, ao pormenor, a bravura e a conduta heroica desenvolvida pelos soldados
e oficiais algarvios nas antigas possessões do oriente. Neste livro relatam-se os
sacrifícios e privações, o sofrimento e a saudade, a coragem e a valentia com que
desempenharam as suas missões; mas também os momentos de lazer, os folguedos e tropelias,
o bom humor com que tentavam dissipar a saudade e o temor da morte. Nele se descreve
a acção militar, mas também o trajecto de vida de 27 jovens militares algarvios,
que o João Peres resgatou do injusto esquecimento, a que todos nós votamos, aqueles
que heroicamente defenderam a honra e glória de Portugal, na longínqua Goa, em Damão,
Pequeno e Grande, e na mítica cidade de Diu.
Uma última palavra para as centenas
de fotografias que ilustram este livro, muitas das quais são verdadeiros documentos
para a história da nossa guerra no oriente.
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