sexta-feira, 8 de março de 2019

A origem histórica do Biquíni


Diz-se que a criação do biquíni teve origem no racionamento de tecidos e no baixo poder de compra das mulheres, durante o período da II Guerra Mundial, em cujo decurso um francês, engenheiro de automóveis, de seu nome Luis Réard, desenhou o traje de banho feminino ao mínimo, a que deu o nome de “Bikini”. Lembrou-se dessa designação porque a sua criação era uma verdadeira bomba atómica no mundo da moda. Ora, como dias antes, em Julho de 1946, os Estados Unidos haviam realizado uns testes nucleares na Micronésia, Oceano Pacífico, destruindo por completo o Atol de Bikini, pareceu-lhe que esse nome poderia ser adoptado ao seu modelo como uma forma de homenagem, mas também de protesto, pela destruição do ambiente e pelo uso de armas de destruição maciça.
Brigitte Bardot, aos 19 anos, em Cannes, causando
enorme sensação com o seu provocante biquíni
O projecto era tão ousado que nenhuma modelo se dispunha a usá-lo em público. Por isso Réard teve de contratar uma stripper, de corpo escultural, chamada Micheline Bernardini, que se dispôs a usá-lo num desfile de moda, junto a uma piscina, em Paris, a 11 de julho de 1946. O escândalo foi enorme, tornando-se de facto numa verdadeira "bomba atómica" lançada sobre o mundo da moda. Mas não se pense que se tornou num êxito rápido, como é costume acontecer na moda. Bem pelo contrário. A maioria dos países modernos reprovou o seu uso, e ainda hoje, em muitos países árabes é proibido o uso do biquíni nas praias, como se tratasse de uma afronta ao pudor. Tanto assim era que no primeiro concurso de Misse Mundo, realizado em Londres em 1951, proibiram-se as concorrentes de sequer tentarem experimentar o uso de biquíni no desfile final do certame. O argumento sustentado pelos membros do júri era, mais uma vez, o da preservação da moral e dos bons costumes.
Para que o mundo desse esse passo em frente precisava-se de uma mulher corajosa, que não tivesse medo de enfrentar a oposição dos mais conservadores e até da própria igreja, que contestava os excessos e liberdades da moda. Essa mulher, corajosa e desafiante, surgiu em 1953, durante o Festival de Cannes, na figura da jovem e deslumbrante actriz francesa Brigitte Bardot, que desceu à praia daquela famosa estância turística com um revolucionário biquíni, desenhado com motivos florais, como se a própria Eva voltasse de novo ao convívio dos mortais pecadores.
Repare-se nas reduzidas dimensões do bikini de Brigitte
Bardot, cujo talhe pouco difere dos modelos actuais.
A partir de então, as mulheres de todo o mundo passaram a usar os provocantes biquínis, cada mais curtos e ousados, para afirmarem a sua liberdade e a sua independência, sem medo de serem, por isso, acusadas de atrair a si os olhares concupiscentes dos homens.
Mas, será o biquíni assim tão recente como nos querem fazer crer os designers da moda?
Não tenho a certeza se já existiria, ou não, no tempo dos romanos uma indumentária, talvez mais para uso desportivo do que recreativo, semelhante ao que hoje designamos por biquíni. Em frescos de Pompeia encontraram-se várias pinturas de mulheres a exercitarem-se num ginásio, praticando pugilato e luta greco-romana, usando apenas duas peças de couro para taparem as partes íntimas. Isto faz supor que as mulheres na antiguidade clássica já usavam algo semelhante aos biquínis modernos, certamente nos banhos públicos e saunas privadas, mas talvez também durante a prática dos diversos jogos e competições em que as mulheres tinham o direito de participar.
Este é um assunto que não domino, nem posso asseverar que o uso das duas peças de reduzido vestuário, a que chamamos hoje biquíni, era já usado na antiguidade. O que posso garantir é que na localidade de Piazza Armerina, na Sicília central, foi descoberta a vila imperial romana de Casale, com dezenas de mosaicos de uma beleza esplendorosa, retratando cenas da vida quotidiana no século IV depois de Cristo. Em alguns desses mosaicos vêm-se várias jovens romanas, usando apenas duas peças muito semelhantes ao actual biquíni. Neles se observa que algumas jovens estavam a praticar luta, creio que pugilato - uma modalidade desportiva de tradição olímpica - mas noutros parecem estar a desfilar num cortejo religioso, escoltadas por outras mulheres, cobertas com tecidos transparentes, que talvez fossem as intocáveis vestais.
Mosaico da villa imperial romana de Piazza Armerina, na
 Sicília central, datado do século IV depois de Cristo.
 
Sem querer especular, julgo que algo semelhante ao biquíni já era usado na civilização romana pelas mulheres que frequentavam os banhos públicos, então designados por “Thermae” (de cujo étimo latino deriva a palavra Termas), sendo famosas em Roma as termas de Caracalla, de Nero, de Diocleciano, de Tito e de Trajano, frequentadas diariamente por milhares de patrícios de ambos os sexos, num cenário de majestosa beleza artística, rodeada de colunas e estátuas em mármore de Carrara. As termas públicas repartiam-se por diferentes espaços, para que os seus utentes usufruíssem de sucessivos estágios de temperatura nas águas. Assim, passavam primeiro pelo “Frigidarium”, onde os utentes se banhavam em água fria, passavam depois ao “Tepidarium”, de águas mornas, até chegarem ao “Caldarium” onde as águas quentes proporcionavam o relaxamento muscular. Associada ao uso medicinal da água e à sua fruição térmica, nasceu a ideia clássica do SPA, que mais não é do que uma sigla, cujo desdobramento significa "salus per aquam", uma expressão latina que se traduz literalmente como "saúde pela água".
Pormenor do mosaico anterior
As mais ricas e poderosas famílias romanas, que se estabeleceram ao longo do imenso império, trataram de recriar nas suas “villas” residenciais um equipamento termal, de que ainda hoje subsistem restos arqueológicos visíveis um pouco por todo o nosso país.
Aqui fica uma imagem do mosaico da Villa imperial romana de Piazza Armerina e duas fotos da então muito jovem Brigitte Bardot, em 1953, na praia de Cannes. A bela diva do cinema, está felizmente entre nós (tem hoje 84 anos de idade), embora há muito retirada dos olhares públicos. Muitos de nós se lembram dela pela sua deslumbrante beleza física, pela sua luta contra o uso de peles no vestuário da moda, pela sua cruzada na protecção dos animais domésticos e selvagens, mas certamente já poucos se lembrarão que ela foi a primeira mulher a usar um biquíni em público, desafiando os falsos pudores desta sociedade de hipócritas sibaritas, em que ainda hoje vivemos.

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