A actriz algarvia Maria Clementina |
Depois dos estudos primários frequentou a Escola de Arte
de Representar, onde se distinguiu quase de imediato pelas suas qualidades para
o canto, desenvolvendo muito as suas naturais aptidões com D. Eugénia Mantelli
de quem foi dileta discípula.
As artes do palco, sobretudo o teatro, atraíam a sua
curiosidade e natural ambição de sentir na alma os aplausos do público.
Estreou-se então a 17-11-1919, no Teatro da Trindade, numa opereta, ou teatro
musicado, muito na moda nesse tempo, intitulada «A Bela Risette», integrada na
famosa companhia de Afonso Taveira.
Pouco depois integrou-se na companhia de Luz Veloso, que
tinha como palco o famoso «Chiado Terrasse» (onde, a 18-12-1921, se realizou o
célebre «Comício dos Novos», com Almada Negreiros a proclamar o Futurismo contra
os modelos dominantes da arte), estreando-se no teatro declamado. Curiosamente
tonou-se pouco depois em escriturada de Nascimento Fernandes, distinto artista
algarvio e um dos mais prestigiados nos proscénios portugueses.
Estúdios da «Invicta Film», no Porto, pioneira do cinema luso |
Não quis o destino, infelizmente, que a sua carreira fosse
longa. Talvez por essa razão não tivesse tempo para provar o seu verdadeiro
talento e lograr alcançar os grandes êxitos da ribalta. Pode dizer-se, sem
melindrar a sua memória, que embora Maria Clementina fosse uma artista bastante
popular, faltou-lhe, porém, o sucesso estrondoso, a endeusante fama e a paixão
do público, para se tornar numa diva da Arte de Talma. Em todo o caso, a sua
carreira fez-se de forma ascensional, com a crítica a render-lhe rasgados
elogios e até, por vezes, a render-se ao seu talento. As suas preferências
interpretativas incidiam nas figuras de recorte cómico, caricaturando de forma
maliciosa, histriónica e satírica certos estereótipos da sociedade portuguesa
Georges Pallu, realizador francês da Invicta Film grande impulsionador do cinema português |
Talvez poucos saibam que Maria Clementina foi uma das actrizes
pioneiras do cinema português, ainda no tempo do “mudo”, participando em dois
filmes produzidos pela «Invicta Films», do Porto, e realizados pelo cineasta
francês Georges Pallu, que foi o grande impulsionador da cinematografia
portuguesa. A primeira fita é de 1922, e intitulava-se «O Destino»; a segunda é
de 1925, e designava-se «A Tormenta». Devo acrescentar que o cineasta Georges
Pallu foi contratado a 17-2-1918, pelo portuense Alfredo Nunes de Matos, dono
da «Invicta Film», à célebre empresa cinematográfica «Pathé Frères» de Paris. Quando
chegou a Portugal, a 12-3-1918, deu início ao cinema moderno, artístico e
profissional, sem perder de vista as raízes históricas da cultura lusíada. Pode
dizer-se que o Algarve ficou de algum modo ligado ao arranque da 7ª Arte no
nosso país, já que o primeiro filme produzido, «Frei Bonifácio», foi escrito
por Júlio Dantas, o mais célebre de todos os escritores algarvios do século XX.
Em 1924, o artista António Pinheiro, algarvio dos quatro
costados, e leal amigo de Maria Clementina, realizou com a ajuda de Georges
Pallu, que também escreveu o argumento e até participou como actor de uma fita,
hoje totalmente ignorada, intitulada «Tinoco em Bolandas», na qual a Maria Clementina
desempenhava a baronesa de Sandomil, um dos papéis principais.Cena do filme «Tinoco em Bolandas», de António Pinheiro |
Já no tempo do cinema sonoro, e no estertor da II Guerra
Mundial, em 1945, quando o cinema luso estava em grande pujança, a cineasta Maria
de Lurdes Dias Costa, que como atriz e locutora de rádio, usava o pseudónimo Bárbara
Virgínia, convidou a Maria Clementina para um insignificante papel no filme «Três
Dias Sem Deus», que não obteve a simpatia da crítica, nem do público. O
argumento deste filme era uma adaptação da obra «Mundo Perdido», da autoria do
algarvio adoptivo Gentil Marques, que conheci muito bem nos anos oitenta como
grande impulsionador da imprensa turística no Algarve. A título de curiosidade
se acrescenta que o filme, produzido como todos os anteriormente citados pela «Invicta
Film», era do género drama, e chegou a ser exibido no Festival de Cannes, a 5-10-1946,
sob o título de «Trois jours sans Dieu». A estreia no nosso país ocorreu 30 de A
gosto de 1946, mas não teve a adesão do público, e o sucesso tão aguardado resultaria em breve num inesperado fracasso.
Maria Clementina sendo aparentada, pelo lado paterno, com
o Conde de Farrobo herdara-lhe os genes artísticos, que elevou até aos píncaros
das suas possibilidades, com honra, rigor e competência profissional.gosto de 1946, mas não teve a adesão do público, e o sucesso tão aguardado resultaria em breve num inesperado fracasso.
Descendente, pelo lado materno, de uma importante família
de Lagos, era também sobrinha do tenente-coronel do Estado Maior do Exército
Raul Frederico Rato e do Dr. Jerónimo Cabrita Rato, sendo prima do Dr. Afonso
Eduardo Martins Zuquete, que foi Governador Civil de Leiria.
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