terça-feira, 11 de agosto de 2020

A guerrilha do Remexido recebia ajuda de Espanha

O correio assistente de Vila Real de Santo António – na conformidade do despacho ministerial de 21-2-1838, no qual exigia que os funcionários «participem as ocorrências que houver nos seus districtos» relativas à situação das facções Carlistas na fronteira espanhola – enviou ao Subinspector dos Correios uma carta a relatar o clima político que se vivia na foz do Guadiana. Por sua vez, o subinspector resumiu as informações recebidas e remeteu-as ao ministro Sá da Bandeira nos seguintes termos: 
Trinidad Nieto Carlier. Ayamonte, 1880
«O Correio Assistente de Villa Real de Santo António (…) me convencia por participações Officiaes vindas de Genova se sabe em Ayamonte que naquele Porto embarcarão 3600 armas para serem introduzidas nas costas do Algarvecom destino para o Remechido; sendo o maior numero dellas para Hespanha; e que contra o seu desembarque já estavão tomadas as devidas providencias».[1]
Estas informações prestadas pelo correio assistente de Vila Real de Santo António, durante o período de vigência do governo Setembrvista, aceleraram a decisão de acabar de vez com as guerrilhas do sul. É claro que a sobreviência do miguelismo, na pessoa do Remexido, e os seus constantes ataques às aldeias e vilas da serra algarvia e interior alentejano, causavam um certo desconforto ao governo, derivado das críticas que a oposição cartista, conservadora e tradicionalista, apresentava em sede parlamentar. Os setembristas, que sustentavam ideias progressistas e tinham um projecto reformista muito mais abrangente do que os cartistas de Palmela e do Duque da Terceira (vencedores e principais caudilhos da guerra-civil), adiaram as suas decisões de extermínio da guerrilha por falta de financiamento para sustentar uma força de combate no sul do país, suficientemente numerosa e bem equipada, capaz de vencer as guerrilhas miguelistas. Por isso recorreu do estratagema de lançar um empréstimo público, no valor de 25 contos de réis, cuja subscrição seria integralmente satisfeita pelos principais proprietários e empresários sediados no distrito, conforme atesta o próprio governador civil de Faro: 
Vila Real de Stº António, Porto Comercial
vendo-se à direito a silhueta de Ayamonte
«Em 28 [de Janeiro de 1838] ordenou o Chefe Superior, que se convocasse hum Conselho das Authoridades e Capitalistas desta Cidade e Districto para deliberarem sobre o modo de realizar por meio de hum emprestimo, a quantia de 25.000$000 rs. para o pagamento das tropas, cujo resultado tive a honra de comunicar a V. Excª em o meu Officio nº 53 de 3 de Fevereiro corrente. Eis aqui qual o uso dos poderes extraordinarios conferidos pela citada Ley aos Delegados do Governo de S.M. neste Districto Administrativo em todo o periodo acima marcado».[2]
Remexido, numa gravura da época
Julgo que a principal razão desta decisão, tão célere quanto radical, para acabar com as guerrilhas do Remexido, vem na razão directa da informação prestada pelo correio assistente de Vila Real de Santo António, dando conta de que se encontrava no porto fronteiriço de Ayamonte um grande número de armas, parte das quais, cerca de 3600, destinadas às guerrilhas miguelistas, e o restante para equipamento dos rebeldes cartistas espanhóis que se acoitavam junto à fronteira. A proveniência das armas, vindas do porto de Génova, prende-se com o exílio de D. Miguel e com os seus financiadores internacionais, cujo fulcro diplomático se encontrava sediado naquela cidade italiana. 
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[1] Arquivo Histórico dos CTT, Documentos do Correio Geral, 1838, vol. I, fols. 189. 

[2] Arquivo Distrital de Faro, Governo Civil, Livro da Correspondência com os Ministros, 1838-1839, cota 355-A, registo n.º 73, fl. 31 v.º

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